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domingo, 2 de outubro de 2011

Segurança pública: presente e futuro - 2


Reforma da estrutura de governo: integração e autoridade política

Nova abordagem, novas políticas, de natureza intersetorial: falta um agente público apto a implementá-las. Impõe-se, então, criar um novo sujeito da gestão pública. Um ator político dotado de autoridade e competência para integrar as várias áreas da administração.

Hoje, os governos municipais apresentam uma organização segmentada, dividida por secretarias e órgãos vinculados. Cada secretaria cuida de um setor do governo e cada setor do governo corresponde a uma área da vida social. A integração, quando existe – o que é raro –, depende, em geral, de um esforço suplementar, seja ele voluntarista e episódico, seja ele permanente mas assentado em bases precárias. Depende, por exemplo, da instauração de um fórum de políticas sociais.

Ocorre que, com freqüência, os titulares das pastas só comparecem à reunião inaugural do fórum mostrando ao prefeito e aos eleitores seu compromisso com a orientação integracionista ditada pelo prefeito, mas esquecendo-se deles em seguida. Nas reuniões subsequentes, enviam seus representantes, cuja autoridade é apenas delegada, o que transforma o fórum deliberativo em conselho consultivo – condenando-o à ineficiência e o convertendo, tantas vezes, em espaço de disputa política.

Em vez de solucionar o problema da integração, esses fóruns ou conselhos terminam ampliando as dificuldades. Não raro, depois de implantá-los, o prefeito ou a prefeita passa a contar com mais um problema, em vez de menos um. Por incrível que pareça, depois do esforço de integrar através do fórum, o governante vê-se diante da necessidade de criar outro mecanismo para integrar mais esse órgão, o fórum, ao conjunto do governo. E as secretarias permanecem afastadas, distantes umas das outras.

Se o prefeito ou a prefeita não despertar para o equívoco desse caminho, terminará criando o fórum de integração do “fórum de integração” às secretarias e, depois, o fórum de integração dos fóruns de integração. Isso chega a ser en- graçado, porque apresenta uma caricatura do processo, mas há situações que se aproximam do absurdo.

O novo agente público, para constituir-se, exige uma reforma mais profunda e orgânica na estrutura do governo municipal. Uma solução possível – que não exclui outras, ainda mais radicais – é a criação de alguns poucos grupos executivos, responsáveis pela implementação do plano de governo, que deve prestar contas ao prefeito e à sociedade, regularmente.

Com base na definição de metas e a partir da identificação de prioridades, estipulado um cronograma realista e garantidos os recursos necessários, o grupo executivo poderá submeter as políticas setoriais à política intersetorial, desde que se reporte diretamente ao gabinete do prefeito e que seja dotado da autoridade correspondente à magnitude das tarefas.

A transparência, a participação popular, o diálogo intra e extragovernamental, todos esses ingredientes complementam o desenho elementar do funcionamento do novo sujeito da gestão pública. Outras qualidades imprescindíveis são: agilidade, conexão com a ponta, capacidade de intervenção tópica, de planejamento, avaliação e monitoramento, acesso a dados quantitativos e qualitativos, sintonia com microrrealidades locais e compromisso com a gestão global do plano de governo.

Focalização territorial

Outro requisito da eficiência das políticas preventivas é a focalização territorial. É necessário circunscrever a área sobre a qual incidirá a política, ainda que se tenha em mente que as realidades locais se interpenetram, porque as dinâmicas sociais não respeitam fronteiras entre espaços urbanos.

Os habitantes de um bairro atravessam a cidade para trabalhar, estudar, fruir o lazer, beneficiar-se dos serviços públicos ou privados, encontrar membros de sua rede familiar ou social. Por outro lado, “profissionais” do crime migram para áreas nas quais possam aumentar seus ganhos, reduzindo os custos e riscos das operações ilícitas.

Isso significa que o sucesso de uma área da cidade, na contenção do crime, pode implicar, para áreas vizinhas, aumento da insegurança. Claro que essa conseqüência não justifica o imobilismo, mas deve ser levada em conta no planejamento global da política de segurança municipal. A importância da circunscrição territorial para as políticas preventivas decorre de fatores intersubjetivos e objetivos.

Quando a prefeitura, em comum acordo com a comunidade, define uma agenda local – o que requer focalização política –, mobilizando todos os seus órgãos e recursos e envolvendo os meios de comunicação de massa no mutirão organizado, tem chances de: a) infundir responsabilidade pelas inciativas conjuntas; b) difundir esperança no sucesso do empreendimento; c) valorizar aquela área urbana e seus moradores; d) redefini-los ante a opinião pública da cidade como protagonistas da mudança, sujeitos da transformação, construtores da paz, promotores da ordem urbana cooperativa e solidária, exemplos para a sociedade.

Quando a prefeitura consegue alcançar esses resultados, e) logra converter o estigma (residentes de área degradada, maculada pela violência) em índice positivo (habitantes da área que se tornou paradigma da civilidade urbana), fazendo que as expectativas se invertam, estabilizando-se na direção positiva. Falando em expectativas, estamos no terreno intersubjetivo da segurança.

Do ponto de vista objetivo, a focalização territorial é indispensável para que o diagnóstico seja suficientemente qualificado, os projetos sejam desenhados com precisão, os investimentos mulitssetoriais confluam, alcancem a sinergia necessária e se articulem com a mobilização da própria comunidade, estabelecendo parcerias e redes operacionais na base.

Em outras palavras, a mesma dificuldade que existe na tradução para cada município desse plano nacional se reproduz na escala intramunicipal: o prefeito ou a prefeita terá de adaptar seu plano municipal de segurança às peculiaridades de cada local. Esse esforço é perfeitamente factível, mas exige atenção às características que as dinâmicas assumem em cada bairro ou comunidade.

Consórcio e gestão participativa

É possível mudar a escala da intervenção que visa alterar as condições sociais geradoras da violência e por ela realimentadas, desde que as forças que desejam a mudança somem suas energias e seus recursos, num mutirão sem precedentes, não-voluntarista, competente, apoiado em diagnósticos e orientações técnicas apropriadas, garantindo-se ampla participação e transparência, para que se construa a indispensável confiança entre as partes envolvidas.

O raciocínio nos conduz à proposta: é possível e necessário celebrar um amplo pacto, sob a forma de um consórcio entre o governo municipal e todas as entidades não governamentais dispostas a cooperar.

O processo acompanharia os seguintes passos: constatada a riqueza de iniciativas e de recursos aplicados na área social, no município em questão, por parte da sociedade local, e constatada a conveniência de que o atual quadro de dispersão e fragmentação dê lugar à sinergia entre os esforços e à convergência de investimentos humanos e materiais, propor-se-ia a elaboração de um diagnóstico comum sobre os problemas mais graves, para que se identificassem as prioridades e se definisse uma agenda consensual: quais as principais vítimas? Quais os grupos sociais mais vulneráveis? Como e onde atuar para mudar sua realidade, oferecendo-lhes alternativas de integração e de valorização humana, cultural, econômica e social?

Identificadas as prioridades, definida a agenda e mapeados os alvos principais das iniciativas, torna-se necessário planejar as ações convergentes, visando a objetivos comuns.

Para que mereça credibilidade, não perca a legitimidade e seja positivo, todo esse movimento tem de respeitar os trabalhos que já estão em curso, garantir-lhes a continuidade e evitar a mais leve tentação, seja de cooptação política de tipo clientelista, seja de imposição de uma camisa-de-força autoritária, que sufoque a liberdade e a autonomia que caracterizam as ações da sociedade e dos indivíduos.

Planejadas as ações, elas precisam ser acompanhadas com transparência, de forma ampla, para que avaliações regulares suscitem correções de rota, numa dinâmica de monitoramento participativo. Assim, o consórcio potencializará as ações da sociedade e do poder público municipal, elevando a escala das intervenções voltadas para a transformação social.

Criar-se-ia um fundo público não-estatal, cuja administração seria exatamente pública porém não-estatal, para que se captassem e investissem recursos com absoluta honestidade e com critérios não-político partidários.

Além disso, seria também indispensável celebrar um Contrato Local de Segurança Municipal, a partir de convênios com o sistema de Justiça criminal (Polícias, Ministério Público e Poder Judiciário), visando ao enfrentamento da criminalidade violenta, da desordem urbana e ao provimento de condições para a resolução pacífica de conflitos sociais e interpessoais.

Celebrariam também este Contrato de Segurança Municipal as entidades que prestam serviço de segurança urbana, patrimonial, de vigilância e de proteção às vitimas da violência, ou que se devotam à recuperação de pessoas em conflito com a lei, ou à prevenção da violência e da criminalidade.

FONTE

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